quarta-feira, 18 de agosto de 2010

O Behaviorismo em discussão - Márcia Terra

Doutoranda em Lingüística Aplicada/IEL/UNICAMP

APRESENTAÇÃO
O propósito deste trabalho é tecer algumas considerações sobre o behaviorismo. Para tanto, desenvolvemos o assunto, procurando, em um primeiro momento, reconstituir as condições de emergência do behaviorismo que se verifica em um quadro de crise da Psicologia em busca de sua definição enquanto ciência. Em um segundo momento, buscamos apresentar a linha de evolução do behaviorismo, focalizando as suas principais abordagens quer sejam: (i) behaviorismo Metodológico (Watson); (ii) behaviorismo radical (Skinner); e (iii) behaviorismo Social (Staats).

1. O CONTEXTO DE EMERGÊNCIA DO BEHAVIORISMO: A CRISE NA PSICOLOGIA

Para situar os modos de produção da representação de mundo que deram origem aos modelos de concepção e atuação do Behaviorismo, um termo inaugurado por J.B. Watson em seu artigo publicado em 1913 com o título "Psicologia: como os behavioristas a vêem" (FURTADO, 1999), torna-se importante uma reflexão epistemológica relacionada ao percurso percorrido pela Psicologia em busca da sua definição como ciência. Recuperar tal trajetória, que sempre esteve ligada às visões de mundo e de homem dominantes em cada momento histórico da sociedade, é condição essencial à compreensão do contexto de emergência do behaviorismo e dos tipos de demanda que a Psicologia procurou superar até chegar ao estágio de evolução em que se encontra na atualidade.

Em uma perspectiva histórica, as ciências humanas são marcadas por três concepções de mundo e de homem que apresentam características distintas: a cosmocêntrica, a teocêntrica e a antropocêntrica (FREITAS, 2000). Na primeira concepção, a cosmocêntrica, os homens eram meros expectadores assujeitados aos imperativos do Cosmo que tudo regia. Trata-se de uma visão de homem abstrato, a-histórico e subjugado a uma moral de caráter metafísico. Na segunda concepção, a teocêntrica, os fundamentos que explicam todas as coisas, incluindo a produção do conhecimento, permaneciam situados externamente ao homem, entretanto, deslocando-se dos imperativos do Cosmo foram incorporados pelos desígnios de uma ordem divina, de um Deus criador, que a tudo regia.

A terceira concepção, a antropocêntrica, emerge no Renascimento, época em que se verificam transformações radicais no mundo europeu decorrentes do mercantilismo, movimento que levou à descoberta de novas terras e à acumulação de riquezas pelas nações em formação (França, Itália, Espanha e Inglaterra), caracterizando uma transição para o capitalismo e para a formação de uma nova organização econômica e social. A burguesia que emergia como uma nova classe social, visando a alcançar a sua própria emancipação, reivindica a libertação do homem da sua condição de assujeitado à imutabilidade das leis do universo e defende a possibilidade de desvendar a Natureza.

A descoberta de Copérnico, em 1543, ao rejeitar a síntese aristotélica, descentralizando a posição da Terra no universo, altera a posição do homem no mundo bem como de suas relações com ele, consigo mesmo e com Deus, estabelecendo um rompimento epistemológico com a visão de mundo antigo e medieval paradigmado pelo determinismo físico e ontológico da esfera celeste e introduz, assim, uma nova maneira de perceber o homem. (FREITAS, 2000:44).

Com a revolução científica do século XVI, conforme assevera Santos (1997), instaura-se um modelo geral de racionalidade que viria a ser desenvolvido nos séculos vindouros, embora que timidamente no século XVIII, mas que alcança o âmbito das ciências sociais emergentes, no século XIX,

Um modelo totalitário, na medida em que nega o caráter racional a todas as formas de conhecimento que não se pautarem pelos seus princípios epistemológicos e pelas suas regras metodológicas, sendo esta a sua característica fundamental e que melhor simboliza a ruptura do novo paradigma científico com os que o precedem (ibid, p.11)

Em meados do século XVIII, a ciência moderna, saída da revolução científica do século XVI, caracteriza-se pelo crescimento da nova ordem econômica - o capitalismo - que, no século XIX, desencadeia o processo de industrialização e, com ele, a necessidade de respostas e soluções práticas no campo da técnica, um movimento que acarretou transformações sem precedentes na história da humanidade.

A Psicologia que até meados do século XIX constituía um ramo da Filosofia encontrava-se marcada por duas vertentes teóricas antagônicas e inconciliáveis, sendo uma de tendência objetivista e a outra de tendência subjetivista. Ambas herdadas das proposições de dois grandes filósofos: Bacon (1214-1292), fundador do materialismo inglês, cujas idéias valorizam o papel da experiência da ciência (FREITAS, op.cit.) e Descartes (1596-1659).

Descartes, um dos filósofos mais expressivos para o avanço da ciência, postula a separação radical entre o corpo e a alma, ou seja, entre o físico e o psíquico, argumentando que o estudo científico do homem deveria restringir-se ao seu corpo físico, enquanto que à Filosofia estaria designado o estudo da sua alma (DESCARTES, 2000). O dualismo corpo-mente proposto por Descartes dá origem às duas grandes vertentes da Filosofia no século XIX - o idealismo, de tendência subjetivista e o materialismo-mecanicista, de tendência objetivista - que permeiam a Psicologia em geral (FREITAS, 2000; LURIA, 2001; COLE&SCRIBNER, 2000, entre outros).

Conforme pontua Freitas (2000, com base em Japiassu e Marcondes, 1990:68), Descartes foi quem introduziu os conceitos de reflexo e de consciência (muito embora ele não tenha usado o termo consciência mas o cogito que é "a descoberta do espírito por si mesmo, que se percebe que existe como sujeito"). Com Descartes, portanto, de acordo com Freitas (2000:49), surge "o princípio da introspecção, da auto-reflexão da consciência, que teve influência sobre as tendências idealistas, enquanto a interpretação mecanicista ou naturalista da conduta humana representou a sua influência sobre as tendências materialistas".

Emmanuel Kant, filósofo alemão cujas idéias filosófico-racionais derivam da incorporação de elementos como liberdade, individualismo e igualdade que constituíram a concepção de mundo da burguesia européia entre os séculos XII e XVIII, exerceu grande influência rumo ao subjetivismo "ao situar o mundo das idéias na consciência individual" (FREITAS, op.cit.). No continente europeu, seus seguidores afirmavam que "idéias de espaço e tempo e conceitos de quantidade, qualidade e relação originavam-se na mente humana e não poderiam ser decompostas em elementos mais simples” (COLE&SCRIBNER, 2000).

A tendência materialista-mecanicista de Descartes foi refletida nos materialistas franceses do século XVIII e no materialismo sensualista de John Locke (1632-1704), na Inglaterra. Os seguidores de Locke desenvolveram sua visão empirista de mente dando conta de que as idéias eram constituídas a partir de sensações produzidas por estimulação ambiental. Comte (1798-1857) introduz a era da positividade, e a noção de introspecção, sendo as suas idéias seguidas por psicólogos empiristas que partiram para o estudo positivo.

Com Wundt (1832-1920) foi dado o passo definitivo para a constituição da Psicologia Experimental e, portanto, da Psicologia como ciência. Para Wundt importava uma Psicologia que só admitisse fatos e, dessa forma, o seu programa de estudos voltou-se à experimentação e à mensuração a fim de controlar os dados fornecidos pela introspecção. A trajetória de consolidação da Psicologia como ciência inclui, ainda, a influência da Biologia Evolucionista de Darwin (1809-1882), da Psicologia Experimental dos animais de Thorndike (1874-1949) e da Reflexologia russa de Pavlov (1849-1936).

Em síntese, a linha evolutiva da Psicologia é marcada por um constante oscilar entre as duas vertentes teóricas antagônicas, ora o pêndulo aponta para os princípios de uma tendência objetivista que prioriza o dado externo, e ora aponta para uma tendência subjetivsta calcada na consciência, ambas, por sua vez, objetivando atender às demandas configuradas em cada momento histórico que as originam.

2. O BEHAVIORISMO: O ESTUDO DO COMPORTAMENTO

Conforme pontua Baum (1999) "a idéia do behaviorismo é simples de ser formulada: é possível uma ciência do comportamento". Tal argumento, explica ele, fundamenta-se no fato de que - apesar das controvérsias sobre o sentido de "ciência" ou de "comportamento", incluindo questões sobre "se a ciência do comportamento dever ser a psicologia" ou "se a psicologia é uma ciência" - "todos os behavioristas concordam que pode haver uma ciência do comportamento" (id.ibid.). Assim, segundo o autor, o behaviorismo pode ser referido como um conjunto de idéias sobre essa ciência chamada de análise do comportamento, e não a ciência ela própria, o behaviorismo não é propriamente uma ciência, mas uma filosofia da ciência. Como filosofia do comportamento, entretanto, aborda tópicos que muito prezamos e que nos tocam de perto: por que fazemos o que fazemos e o que devemos e não devemos fazer.

Visando à melhor compreensão desse conjunto de idéias, abordamos, a seguir, as características relacionadas aos três principais modelos de Behaviorismo já que, desde a sua primeira geração, o sentido de "comportamento" sofreu transformações importantes.

2.1. A PRIMEIRA GERAÇÃO: BEHAVIORISMO METODOLÓGICO

John B. Watson, com a publicação do seu artigo intitulado "Psicologia: como os behavioristas a vêem", inaugura, em 1913, o termo que passa a denominar uma das mais expressivas tendências teóricas ainda vigentes: o Behaviorismo. O termo inglês "behavior" significa "comportamento", razão pela qual usamos, no Brasil, Behaviorismo como também Comportamentalismo, Análise Experimental do Comportamento, entre outros, para nos referirmos à visão teórica em pauta (FURTADO, op.cit.). Ao postular o comportamento como objeto de estudos da Psicologia, Watson estabelece um objeto de estudos "observável e mensurável, cujos experimentos poderiam reproduzir diferentes condições e sujeitos” (ibid. p.45).

As concepções de Watson, guiadas pela psicologia objetiva de Comte, representam uma grande oposição à introspecção, movimento que vigorava na época, assim como rejeitavam também a analogia como métodos. As proposições de Watson, portanto, trouxeram respostas essenciais aos objetivos que os psicólogos buscavam na época e contribuíram para o rompimento definitivo da psicologia com a sua tradição filosófica. Como lembra Staats (1980),

(...) antes do aparecimento do behaviorismo, o método fundamental para a Psicologia era o da introspecção. Por algum tempo os psicólogos pensaram que a tarefa da psicologia era investigar os conteúdos, a estrutura e o funcionamento da mente, realizando o sujeito um auto-exame e relatando a sua experiência (...) o comportamento animal era igualmente interpretado adotando-se o conceito de consciência humana.

O behaviorismo metodológico toma como base o realismo. O realismo defende a idéia de que há um mundo real, que ocorre no mundo real, sendo que é a partir desse mundo real externo - objetivo - que constituímos o nosso mundo interno - subjetivo. Paradoxalmente, temos contato apenas com a nossa experiência interna que nos é dada pelos nossos sentidos. Isso porque o mundo externo, objetivo, não nos é accessível diretamente. Assim, os nosso sentidos nos fornecem apenas dados sensoriais sobre aquele comportamento real que nunca conhecemos diretamente (BAUM, op.cit).

Como behaviorista metodológico, portanto, o interesse de Watson concentra-se na busca de uma psicologia livre de conceitos mentalistas e de métodos subjetivos e que possa reunir condições de prever e de controlar. Para tanto, torna-se importante, em compasso com o realismo, estabelecer uma dicotomia entre o mundo objetivo-mundo subjetivo. À ciência, constituída de métodos próprios ao estudo do mundo objetivo, caberia lidar apenas com o mundo que está 'fora' do sujeito, o mundo que é compartilhado, accessível a outras pessoas e com o qual, por conseguinte, todos poderiam, potencialmente, concordar.

Entendendo que o homem possui um aparato orgânico que se ajusta ao ambiente em que vive por meio de equipamentos hereditários e pela formação de hábitos, Watson defende a idéia de que o comportamento deve ser estudado como função de certas variáveis do meio, sob o argumento de que certos estímulos levam o organismo a dar determinadas respostas. Nessa linha de raciocínio, ele procura descrever os eventos comportamentais atribuindo-lhes um caráter mecânico e o mais próximo possível da fisiologia, uma vez que as razões que estariam subjacentes ao 'levar' o homem a desempenhar o comportamento deveriam ser tratadas isoladamente.

O behaviorismo de Watson fundamenta-se em uma das leis mais famosas do behaviorismo metodológico que é a de Pavlov: o condicionamento clássico, ou o reflexo incondicionado que consiste, tomando as palavras de Furtado (op.cit.:47), "em respostas que são eliciadas (produzidas) por estímulos antecedentes do ambiente (ex. contração das pupilas quando há luz forte sobre os olhos)”.

Aprofundando e ampliando tais noções, Watson chega ao conceito de "reflexo condicionado" que consiste em interações estímulo-resposta (ambiente-sujeito) nas quais o organismo é levado a responder a estímulos que antes não respondia. Isso se dá em função de um pareamento de estímulos, como por exemplo: imergir a mão na água gelada e ouvir o som de uma campainha repetidas vezes. Depois de um certo tempo, a mudança de temperatura nas mãos poderá ser eliciada apenas pelo som da campainha, isto é, sem a necessidade de imersão das mãos (FURTADO, op.cit.).

A formulação do behaviorismo de Watson é representada pela relação S-R, onde S é o estímulo do ambiente e R a resposta do organismo.

2.2 A SEGUNDA GERAÇÃO: BEHAVIORISMO RADICAL

B.F. Skinner, em 1945, introduz o Behaviorismo radical, defendendo a análise experimental do comportamento. Contrapondo-se ao Behaviorismo metodológico de Watson, de cunho realista, o programa de Skinner adota os princípios do pragmatismo, cuja base é a de que a força da investigação científica reside não tanto na descoberta da verdade sobre a maneira como o universo objetivo funciona, mas no que ela nos permite fazer, ou seja, a grande realização da ciência é que ela permite dar significado a nossa experiência. Isso implica entender que o pragmatismo se preocupa com a funcionalidade do objeto real observável, mensurável, e não com a existência de um objeto real por detrás desses efeitos (BAUM, op.cit.; FURTADO, op.cit.).

Os behavioristas radicais, nessa linha, tentam romper com o dualismo mundo objetivo-mundo subjetivo.Ou seja, em vez de se pautarem em métodos, eles adotam conceitos e termos "os termos que usamos para falar do comportamento não apenas nos permitem compreendê-lo, mas também o definem: comportamento inclui todos os eventos sobre os quais podemos falar sobre eles com os nossos termos inventados", conforme citação de Skinner, em Baum (op.cit.). Nessa esteira, os beharioristas radicais equiparam a noção de verdade com poder explicativo e, então, buscam termos descritivos que sejam "úteis à compreensão e econômicos à discussão" - se a pergunta sobre a existência do universo real fora do sujeito é fútil, então também é fútil perguntar sobre a existência de uma verdade final, absoluta (idem).

Dessa perspectiva, os behavioristas radicais admitem todos os eventos naturais - passíveis de serem acessados - incluindo eventos públicos e privados e excluem os eventos fictícios - que não podem ser acessados. A mente e todas as suas partes e processos, como causas mentais do comportamento, são considerados fictícios e, portanto, constituem termos que devem ser evitados.

O mentalismo é, portanto, insatisfatório, na medida em que é anti-econômico. Os behavioristas radicais assumem, dessa forma, que as causas do comportamento encontram-se na hereditariedade e no ambiente passado e presente.

À luz do que precede, o behaviorismo radical de Skinner está na formulação do "comportamento operante" que pode ser representado pela relação: R à S , em que R é a resposta e S (do inglês 'Stimuli') é o estímulo reforçador que tanto interessa ao organismo, e a flecha significa 'levar a'. A esse respeito, segundo Keller (1973 apud Figueiredo op.cit.) o comportamento operante inclui todos os movimentos de um organismo dos quais se possa dizer que em algum momento têm efeito sobre ou fazem algo ao mundo em redor. O comportamento operante opera sobre o mundo, por assim dizer, quer direta, quer indiretamente.

Ou seja, no caso do comportamento operante a aprendizagem deixa de ser um mero condicionamento de hábitos e passa a considerar a interação sujeito-ambiente. Difere-se da relação R-S do comportamento respondente ou reflexo (Watson) na medida em que o estímulo reforçador que é chamado de REFORÇO assume a responsabilidade pela ação, apesar de ela ocorrer após a manifestação do comportamento. Neste caso, o que vai propiciar a aprendizagem dos comportamentos é a relação fundamental - a relação entre a ação do sujeito (emissão da resposta) e as conseqüências. Quer dizer, a aprendizagem está na relação entre uma ação e o seu efeito, significando entender com isso que as conseqüências das respostas às ações que praticamos são as variáveis de controle mais relevantes na determinação de nossos comportamentos subseqüentes.
Em resumo, estudar o comportamento é fazer uma análise funcional do comportamento - (F) S à (F)R - é descrever as funções que determinam uma dada resposta, ou seja, analisar as contingências (conjunto hipotético de relações funcionais) que determinam o comportamento.que envolve três dimensões: (a) eventos antecedentes; (b) respostas; (c) eventos conseqüentes. Muito embora só se possa definir a função reforçadora de um evento ambiental a partir da função que ele exerce sobre o comportamento do indivíduo, tem-se como definição que o 'reforço positivo' representa um evento que aumenta a probabilidade futura da resposta que o produz, tanto quanto um 'reforço negativo' representa um evento que aumenta a probabilidade futura da resposta que o remove ou atenua (FURTADO, op.cit.).

3. A TERCEIRA GERAÇÃO: BEHAVIORISMO SOCIAL

Concordando com a idéia de que "as revoluções são feitas, geralmente, contra os grupos que estão no poder" mas discordando, contudo, de revolucionários extremistas que "demolem a velha ordem e não se preocupam em separar o que existe de certo e errado na mesma", Staats (1980) reivindica a sua posição de representante da 3a. geração de behavioristas, objetivando ultrapassar as duas gerações de behavioristas precedentes. Conforme diz ele, os dois movimentos anteriores caracterizam-se, justamente, pelo caráter extremista de seus programas.

Staats (1980) assevera que embora o programa de Watson tenha sido uma correção para os abusos da época, ele foi radical e por isso mesmo rejeitou importantes áreas de estudos, estendendo esta rejeição aos termos e métodos da introspecção. Da mesma forma, enfatiza o autor, a abordagem de Skinner

Manteve o extremismo da revolução original de Watson. Esta abordagem rejeita, sem maiores exames, os métodos, conceitos, princípios e observações das ciências sociais. Ele não elabora princípios que considerem a forma pela qual os seres humanos diferem dos animais. Não existe evidência de que o conhecimento social de qualquer outra espécie tenha sido sistematicamente formulado e tenha valor (...) significa, na prática, que qualquer outra coisa que não seja o condicionamento operante ou que não possa ser explicado como tal, incluindo muito do próprio behaviorismo, é rejeitado (ibid, p. 100-101)

Para Staats, uma característica fundamental da abordagem de Skinner e de seus seguidores é a de ser um sistema fechado. Trata-se, argumenta o autor, de um sistema restritivo e improdutivo, na medida em que a freqüência da resposta é o dado básico de Skinner e ele considera ser o único válido. E nesse sentido, enfatiza Staats (1980), Skinner "radicalizou o conflito entre o behaviorismo e as ciências humanísticas no que se refere à concepção de homem" (ibid p.102).

Igualmente, o behaviorismo de Watson, prossegue o autor, "fracassou porque não considerou as pesquisas do comportamento humano que seguiam outras orientações" (id.ibid).

Assim, Staats (1980) reivindica para a evolução do behaviorismo a integração e união de áreas do conhecimento, enfatizando a necessidade de "um paradigma que conduza à unidade todo esse esforço científico no estudo do homem", ou como diz ele "o que precisamos é de uma terceira geração de behaviorismo, o behaviorismo social" (ibid p.103). Em linhas gerais, os desenvolvimentos mais significativos do quadro conceitual da Teoria da Aprendizagem Social, que surgem a partir de Staats, englobam, dentre outros, os seguintes aspectos que passamos a discutir.

A primeira grande modificação introduzida foi o reconhecimento de que a análise do comportamento deve considerar os processos simbólicos, uma vez que a capacidade de utilizar a linguagem instrumentaliza a possibilidade de representação de eventos e de situar o presente com base em experiências passadas. Em decorrência, ao contrário das duas abordagens anteriores do behaviorismo, o interesse concentra-se na análise cuidadosa do pensamento e dos mecanismos que este utiliza para controlar a ação.

Uma Segunda inovação importante diz respeito "à concepção de comportamento como uma interação contínua e recíproca entre fatores ambientais, comportamentais e cognitivos" (DAVIS, s/d: 77).

Uma nova visão que se contrapõe à de Skinner que concebe o comportamento como uma via de mão única, ou seja, assujeitando o homem à ação do ambiente. Em contraste aos pressupostos deterministas das abordagens anteriores que tratam os homens como organismos meramente passivos a um constante bombardeio de estímulos ambientais, o behaviorismo social coloca em pauta a ênfase nos processos auto-regulatórios. Passa a vigorar um determinismo recíproco entre homem-ambiente. O homem é capaz de direcionar o curso da sua ação, isto é, transforma-se em um organismo ativo que é capaz de selecionar e organizar dentre os estímulos que determinam as suas respostas, aqueles que considera relevantes.

Uma terceira modificação é a noção de "aprendizagem através de modelação" que se refere à aquisição de conhecimentos e comportamentos novos por meio de observação. A característica fundamental dessa abordagem é a de que "grande parte da aprendizagem humana depende de processos perceptuais e cognitivos". Quer dizer, "o reforço direto da própria ação é apenas uma das variáveis que atuam o processo de aquisição de novos padrões de respostas" (ibid. p.79). Assim, as expectativas individuais independem de resultados produzidos pelas próprias ações, ou seja, as respostas às ações de outros são importantes para guiar o próprio comportamento.

Enfim, a noção de behaviorismo social caminha em direção a uma explicação do comportamento que leva em conta a interação homem-ambiente de uma forma mais ampla do que os programas das duas gerações do behaviorismo anteriores tentaram propor.

CONSIDEAÇÕES FINAIS

Neste trabalho, a nossa intenção consistiu em focalizar o Behaviorismo, procurando traçar as suas condições de emergência e transformações dentro da linha evolutiva da Psicologia. Em linhas gerais, abordamos as características dos três principais modelos de Behaviorismo: behaviorismo metodológico - que toma como base o realismo e cuja expressão máxima é Watson; behariorismo radical - que toma como base os princípios do pragmatismo e que tem como expressão máxima Skinner; e o behaviorismo social - que nasce com Staats, em oposição aos dois programas anteriores por considerá-los sistemas fechados e, portanto, reducionistas. Dessa forma, o behaviorismo é direcionado a uma concepção mais humanística do comportamento.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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STAATS, A.W. Behaviorismo social: uma ciência do homem com liberdade e dignidade. In: Arquivos brasileiros de psicologia 32(4): 97-116, 1980

[1] Trabalho apresentado em 2003, para a disciplina "Desenvolvimento e Aprendizagem", ministrada pelo Prof. Dr. Sérgio Leite, na Faculdade de Educação da Unicamp.



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